Análise da Confederação Nacional do Transporte revela subutilização de bilhões de reais destinados à segurança viária e educação, propondo medidas urgentes para reverter o cenário.

A CNT apresenta propostas para otimizar a aplicação desses recursos em prol da segurança viária e de ações de educação no trânsito.. Foto: khoroshkov para Depositphotos
A segurança no trânsito é uma preocupação constante no Brasil, onde milhares de vidas são perdidas anualmente em sinistros. Para enfrentar esse desafio, o país conta com o Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset), um instrumento vital para financiar ações de prevenção e melhoria da infraestrutura viária. No entanto, uma recente análise aprofundada da Confederação Nacional do Transporte (CNT), divulgada em sua Série Especial de Economia – Investimentos em Transporte: Funset, lança luz sobre uma realidade preocupante: a subutilização massiva dos recursos desse fundo.
O estudo da CNT, que examina detalhadamente a evolução das receitas e despesas do Funset, aponta um cenário de bilhões de reais autorizados que simplesmente não chegam ao seu destino final, comprometendo a efetividade das ações de segurança e educação no trânsito. A CNT não apenas expõe o problema, mas também apresenta propostas concretas e urgentes para otimizar a aplicação desses recursos, visando um impacto real na redução de acidentes e na proteção da vida dos brasileiros.
O papel essencial do Funset e o dilema do contingenciamento
Criado em 1997, junto com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o Funset tem um propósito claro e fundamental. Ele deve ser a fonte de financiamento para iniciativas que promovam um trânsito mais seguro. Seus recursos são oriundos de 5% da receita que se arrecada com multas de trânsito em todo o território nacional. A legislação é explícita quanto às finalidades desses fundos, determinando que sejam aplicados exclusivamente em sinalização, engenharia de tráfego, policiamento, fiscalização e, de forma crucial, em educação no trânsito.
Mais recentemente, em 2022, a Lei nº 14.440 ampliou o leque de possibilidades. Assim, permitindo que o Funset também custeie a renovação da frota rodoviária por meio do Programa Renovar. Essa inclusão reconhece a importância de uma frota mais moderna e segura para a redução de sinistros. Isso porque veículos antigos podem ser um fator de risco significativo.
Apesar da clareza de seu propósito e da urgência das demandas que deveria atender, os dados apresentados pela CNT revelam um uso ineficaz desses recursos ao longo dos anos.
“A prática de contingenciamento, que consiste em reter ou limitar o uso dos recursos autorizados, tem sido uma constante e, para a CNT, é o principal entrave para a plena atuação do Fundo. O estudo aponta que, entre 2005 e 2024, de um total de R$ 23,46 bilhões em despesas autorizadas, apenas 21,8% foram efetivamente aplicados nas finalidades para as quais o Funset foi criado.”
Essa discrepância entre o que se planeja e o que se executa tem consequências diretas na vida dos cidadãos. Menos investimento em sinalização significa estradas e ruas mais perigosas. A falta de recursos para engenharia de tráfego atrasa melhorias estruturais que poderiam salvar vidas. E, talvez o mais grave, o contingenciamento limita as campanhas de educação no trânsito, essenciais para formar condutores e pedestres mais conscientes e responsáveis.
Propostas da CNT para um Funset eficiente
Diante desse cenário preocupante, a CNT não se limita a diagnosticar o problema. O estudo propõe três medidas principais e interligadas que, se implementadas, poderiam transformar a gestão do Funset e, consequentemente, a segurança viária no Brasil:
1 – Vedação ao contingenciamento dos recursos do Funset: esta é a medida mais enfática e crucial. A CNT defende que se deve utilizar os recursos do Funset em sua totalidade, sem retenções orçamentárias. Ao vedar o contingenciamento, garante-se que os bilhões de reais arrecadados com multas sejam integralmente direcionados para as ações de segurança e educação no trânsito. Dessa forma, cumprindo a finalidade para a qual foram criados. Essa medida visa acabar com a prática de desvio de propósito dos fundos, que, embora legalmente vinculados, acabam sendo retidos por questões orçamentárias gerais.
2 – Aplicação prioritária em instalação, renovação e manutenção da sinalização de trânsito: a sinalização viária é a linguagem do trânsito. Uma sinalização adequada e bem mantida é fundamental para orientar motoristas e pedestres, prevenir acidentes e garantir o fluxo seguro de veículos. A CNT argumenta que, com a vedação do contingenciamento, deve-se redirecionar uma parcela significativa desses recursos para a instalação de novas sinalizações onde há deficiência, a renovação de placas e marcações desgastadas pelo tempo e a manutenção preventiva e corretiva de toda a infraestrutura de sinalização. Sem uma sinalização clara e visível, o risco de colisões, atropelamentos e outros acidentes aumenta drasticamente.
3 – Investimento na renovação da frota circulante, implementando efetivamente o Programa Renovar: a inclusão do Programa Renovar como finalidade do Funset é uma oportunidade valiosa para modernizar a frota de veículos do país. Veículos antigos, sem equipamentos de segurança modernos ou com manutenção precária, são um perigo nas estradas e cidades. A CNT defende que se utilize o Funset para incentivar a renovação da frota. Seja por meio de programas de sucateamento de veículos antigos com incentivo à compra de novos, ou outras políticas que facilitem a aquisição de veículos mais seguros e menos poluentes. A renovação da frota não apenas contribui para a segurança, mas também para a sustentabilidade e a eficiência do transporte.
Um apelo por maior compromisso com a vida
O estudo da CNT é um chamado à ação. Ele demonstra que, apesar de existir um mecanismo de financiamento específico para a segurança no trânsito, a ineficiência na gestão e a prática do contingenciamento estão impedindo que os recursos cheguem onde são mais necessários. O Funset, com seu potencial de R$ 23,46 bilhões em duas décadas, poderia ter um impacto muito maior na redução de acidentes. Além disso, na conscientização dos cidadãos.
“De acordo com Celso Mariano, especialista e diretor do Portal do Trânsito, essa análise reforça a urgência de um debate sério e de ações governamentais concretas. “O trânsito brasileiro clama por investimentos em infraestrutura, fiscalização e, acima de tudo, em educação. Garantir que os recursos do Funset sejam plena e eficientemente aplicados não é apenas uma questão orçamentária, mas um compromisso inadiável com a preservação de vidas”, finaliza.
Portal do Trânsito, 10 de junho de 2025
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